quinta-feira, 24 de maio de 2012

COLUNA DO PAULO TIMM(de Portugal) - A SÍRIA, CENTRO DA GUERRA DO GÁS NO PRÓXIMO ORIENTE.

 





23/05/2012 20h00 - www.torres-rs.tv

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DA GEOPOLÍTICA DO PETRÓLEO À GEOPOLÍTICA DO GÁS NATURAL

A SÍRIA, CENTRO DA GUERRA DO GÁS NO PRÓXIMO ORIENTE.

Por IMAD FAUZZI SHUEIBI

Fonte - Reseau Voltaire

O ataque midiático e militar contra a Síria está diretamente ligado à disputa mundial por energia, assim explica o professor Imad Shueibi no artigo magistral que publicamos. No momento mesmo em que a zona do euro ameaça soçobrar, onde uma crise econômica aguda conduziu os Estados Unidos a se endividar em 14 trilhões e 940 bilhões de dólares,e onde sua influência se reduz face às potências emergentes do BRICS, torna-se claro que a chave do sucesso econômico e da dominação política reside principalmente no controle da energia do vigésimo primeiro século: o gás. Exatamente por que a Síria se encontra no coração da mais colossal reserva de gás do planeta é que ela é tomada como alvo. As guerras do último século eram as do petróleo, mas uma nova era começa: a das guerras do gás. (RÉSEAU VOLTAIRE).


Com a derrota da União Soviética, os russos concluíram que a corrida armamentista os havia deixado inteiramente vendidos, sobretudo no que concerne aos estoques de energias necessárias a todo país industrializado. Ao contrário, os USA tinham tido condições de se desenvolver e decidir a política internacional sem muitas dificuldades graças à sua presença nas zonas petrolíferas depois de décadas. Essa é a razão pela qual os russos decidiram de sua parte se estruturar sobre as fontes de energia, tanto no petróleo quanto no gás. Considerando que o setor petrolífero, tendo em vista sua distribuição internacional não oferecer perspectivas, Moscou concentrou investimentos no gás, sua produção, estocagem, seu transporte e sua comercialização em grande escala.

O sinal de partida foi dado em1995, quando Vladimir Putin iniciou a estratégia do GASPROM: partir das zonas produtoras de gás da Rússia para o Azerbaijão, o Turcomenistão, o Irã (para a comercialização), até o Próximo Oriente. É certo que os projetos NORDSTREAM E SOUTH STREAM serão os testemunhos perante a história do mérito e dos esforços de Vladimir Putin de reconduzir a Rússia na arena internacional e influenciar a economia europeia porque ela dependerá, durante os decênios futuros, do gás como alternativa ou complemento do petróleo, com prioridade maior para o gás. A partir daí, tornou-se urgente para Washington criar o projeto concorrente NABUCCO, para rivalizar com os projetos russos e esperar para desempenhar um papel naquilo que vai determinar a estratégia e a política para os próximos cem anos.

O fato é que o gás será a principal fonte de energia do século 21, não só como alternativa à baixa das reservas mundiais de petróleo, mas como fonte de energia própria. Em consequência, o controle das zonas produtoras de gás do mundo pelas antigas e as novas potências é a base de um conflito internacional cujas manifestações são regionais.

É evidente que a Rússia examinou muito bem os mapas geológicos e aprendeu as lições do passado, porque foi a falta de controle no nível dos recursos energéticos globais, indispensáveis à injeção de capital e de energia na estrutura industrial, a origem do desmoronamento da União Soviética. A partir daí a Rússia compreendeu que o gás seria o recurso energético do século seguinte.

HISTÓRICODO GRANDE JOGO DO GÁS

Uma primeira leitura do mapa geológico do gás revela que ele está localizado nas regiões seguintes, em termos de minas produtoras e acesso às zonas de consumo:

1. Rússia:VYBORG E BEREGVYA

2. Anexada à Rússia: TURCOMENISTÃO

3. Vizinhos da Rússia: AZERBAIJÃO E IRÃ

4. Território ocupado pela Rússia: GEORGIA

5. Mediterrâneo Oriental: SÍRIA E LIBANO

6. CATAR EEGITO.

Moscou avançou rapidamente seu trabalho com dois objetivos estratégicos: o primeiro é a implementação de um projeto sino-russo, a longo prazo, apoiando-se sobre o crescimento econômico do Bloco de Xangai; o segundo visando controlar os recursos do gás. Assim foram lançadas as bases dos projetos SOUTHSTREAM E NORD STREAM, em oposição ao projeto estadunidense NABUCCO, sustentado pela União Europeia, que visa o gás do mar Negro e do Azerbaijão. Entre essas duas iniciativas resultou uma corrida estratégica para o controle da Europa e dos recursos do gás.

PARA A RÚSSIA: o projeto NORD STREAM liga diretamente a Rússia à Alemanha, passando através do mar Báltico até Weinberg e Sassnitz, sem passar pela Bielorússia.

O projeto SOUTH STREAM começa na Rússia, passa através do Mar Negro até a Bulgária e se divide entre a Grécia e o sul da Itália de uma parte, e a Hungria e Áustria da outra.

PARAOS ESTADOS UNIDOS:
O projeto NABUCCO parte da Ásia Central e do entorno do Mar Negro, passa pela Turquia onde se situa a infra-estrutura da estocagem, depois percorre a Bulgária, atravessa a Romênia, a Hungria, chega à Áustria e de lá se dirige para a República Tcheca, a Croácia, a Eslovênia e a Itália. No projeto original o percurso deveria passar pela Grécia, mas esta ideia foi abandonada sob a pressão turca.

O projeto NABUCCO está estruturado para concorrer com quaisquer dos projetos russos. Seu inicio foi previsto para 2014, mas teve que ser adiado para 2017, em face de dificuldades técnicas. No momento em que o funcionamento do projeto NABUCCO foi adiado, a batalha do gás passou para a liderança do projeto russo, embora cada um esteja buscando permanentemente estender seu projeto a novas zonas de controle.

Tais fatores estão condicionados de um lado pelo gás iraniano, que os Estados Unidos desejam venha reforçar o projeto NABUCCO ligando-se ao ponto de concentração de Erzurum, na Turquia; e do outro lado o gás do Mediterrâneo oriental: Síria, Líbano e Israel.

Acontece que em julho de 2011, o Irã assinou diversos acordos relativos ao transporte de seu gás via Iraque e Síria. Em consequência, daqui para frente a Síria tornou-se o principal centro de estocagem e de produção, em ligação com as reservas do Líbano. Dessa nova situação, um novo espaço geográfico, estratégico e energético se abre, compreendendo o Irã, o Iraque, a Síria e o Líbano. Os entraves que esse projeto enfrenta depois de mais de um ano dão a ideia do nível de intensidade da luta que se disputa para o controle da Síria e do Líbano. Ao mesmo tempo, essa luta aclara com bastante nitidez o papel desempenhado pela França, que considera o Mediterrâneo oriental como sua zona de influência histórica, devendo servir eternamente aos seus interesses e onde é necessário recuperar sua ausência depois da Segunda Guerra mundial. Em outros termos a França quer desempenhar um papel no mundo do gás onde ela adquiriu de qualquer forma um “seguro saúde” na Líbia e quer, a partir de agora um “seguro vida” através da Síria e do Líbano.

Quanto à Turquia, ela sente que será excluída dessa guerra do gás, pois o projeto NABUCCO está atrasado e ela não faz parte de nenhum dos dois projetos SOUTH STREAM e NORD STREAM, o gás do Mediterrâneo Oriental parece lhe escapar inexoravelmente na medida em que se distancia do projeto NABUCCO.

Para desenvolver seus dois projetos, Moscou criou a SOCIEDADE GASPROM nos anos 1990. A Alemanha, que desejava se libertar de uma vez por todas das repercussões da Segunda Guerra Mundial, se prepara para ser parte integrante; quer seja em matéria de instalações, de revisão do gasoduto NORTE, quer seja como local de estocagem para a linha SOUTHSTREAM, dentro de sua zona de influencia, particularmente a Áustria.

A SOCIEDADE GAZPROM foi fundada com a colaboração de Joachim Gornig, um alemão próximo de Moscou, antigo vice-presidente da companhia alemã de petróleo e de gás industriais que supervisionou a construção da rede de gasodutos da RDA. Ela foi dirigida até outubro de 2011 por Vadimir Koteneve, antigo embaixador da Rússia na Alemanha.

GASPROM assinou numerosos contratos com empresas alemãs, de primeiro nível entre as que cooperam com NORD STREAM, tais como os gigantes E.ON para a energia e BASF para os produtos químicos; com a E.ON existem cláusulas garantindo tarifas preferenciais em caso de alta de preços, o que será de fato uma espécie de subvenção “política” das empresas do setor energético alemão pela Rússia.

Moscou tirou vantagens da liberalização dos mercados europeus de gás constrangendo-os a desconectar as redes de distribuição das instalações de produção. A página dos afrontamentos entre a Rússia e Berlim estando resolvida, inicia-se então uma fase de cooperação econômica baseada sobre a redução do peso de uma enorme dívida pesando sobre os ombros da Alemanha, a de uma Europa super endividada pelo jugo dos Estados Unidos. Uma Alemanha que considera que o espaço germânico(Alemanha, Áustria, Republica Tcheca, Suíssa) está destinado a tornar-se o coração da Europa, não tendo que suportar as consequências do envelhecimento de todo um continente, nem o da queda de outra superpotência.

As iniciativas alemãs de GASPROM compreendem o “joint-venture”de WINGAS com WINTERSHALL, uma filial da BASF,que é a maior produtora de petróleo e de gás da Alemanha além de controlar 18% do mercado de gás. GASPROM deu aos seus principais parceiros alemães participações inigualáveis nos seus ativos russos. Assim BASF e E.ON controlam cada cerca de um quarto dos campos de gás Loujno-Rousski é que alimentarão em grande parte o NORDSTREAM; e não é pois uma simples coincidência se o homologo alemão da GASPROM, chamada de GASPROM GERMANICA, CHEGARÁ A POSSUIR 40% da companhia austríaca AUSTRINCENTREX CO, especializada na estocagem do gás destinado a se estender até o Chipre.

Uma expansão que em nada agrada à Turquia que tem uma necessidade vital de participar do projeto NABUCCO. Sua participação consistiria em estocar, comercializar depois transferir 31, depois 40 bilhões de metros cúbicos de gás por ano; um projeto que faz com que Ankara se transforme cada vez mais, num feudo de Washington e da OTAN, considerando ainda mais que sua adesão à União Europeia tem sido rejeitada por diversas vezes.

Os ajustes estratégicos ligados ao gás determinam uma intensidade maior na política que Moscou exerce um loby sobre o Partido Social Democrata alemão na Renana do Norte West Falia, base industrial maior e centro do conglomerado alemão RWE, fornecedor de eletricidade e filial da E.ON.

Essa influência foi reconhecida por Hans-Joseph Fell, responsável pelas políticas energéticas no Partido verde. Segundo ele quatro sociedades alemãs ligadas à Rússia desempenham um papel maior na definição da política energética alemã. Elas se apoiam sobre o Comitê de relações econômicas da Europa do Leste; isto é sobre as empresas em contato econômico estreito com a Rússia e os países do ex-bloco soviético – que dispõe de uma rede bastante complexa de influência sobre os ministros e a opinião pública. Mas na Alemanha mantém-se discrição quanto à influencia crescente da Rússia, partindo do principio que é absolutamente necessário melhorar a “segurança energética” da Europa.

É necessário acentuar que a Alemanha considera que a política da União Europeia para resolver a crise do euro poderia com o tempo perturbar os investimentos germano-russos. Esta razão, dentre outras, explica porque ela arrasta um euro carregado com o peso das dívidas europeias, e o faria mesmo se o bloco germânico pudesse, ele só, suportar essas dívidas. De mais a mais, a cada vez que os Europeus se opõem à sua política face à Rússia, ela afirma que os planos utópicos da Europa não são realizáveis e poderiam levar a Rússia a vender seu gás na Ásia, colocando em perigo a segurança energética europeia.

Este casamento de interesses germano-russos se apoia sobre a herança da guerra fria, que levou três milhões de russófonos a viver na Alemanha, formando a segunda mais importante comunidade depois dos turcos. Putin é igualmente adepto da utilização da rede dos antigos responsáveis da RDA, que assumiram os interesses das companhias russas na Alemanha, sem falar do recrutamento dos ex-agentes da STASI. Por exemplo, os diretores de pessoal e de finanças da GASPROM GERMANIA, ou ainda o diretor de finanças do CONSORTIUM NORD STREAM, Warnig Matthiasque, segundo o WALL STREET JOURNAL, teria ajudado Putin a recrutar espiões em Dresde quando era jovem agente da KGB. No entanto, é necessário reconhecer que a utilização pela Rússia de suas antigas relações não é prejudicial à Alemanha, porque os interesses das duas partes foram atendidos sem que uma dominasse a outra.

O projeto NORD STREAM, principal elo entre a Rússia e a Alemanha, inaugurou recentemente um gasoduto que custou 4,7 bilhões de euros. Esse gasoduto liga a Rússia à Alemanha com o reconhecimento europeu de que tal projeto garante sua segurança energética, o que fez a França e a Holanda prestar rapidamente uma declaração de que se tratava efetivamente de um projeto “europeu”. Desse ponto de vista, é necessário mencionar que M. Lindner, diretor executivo do Comitê Alemão para as relações econômicas com os países da Europa do Leste, declarou sem rir, que este era “um projeto europeu e não alemão, e que ele não conduziria a Alemanha a uma dependência maior da Rússia”. Tal declaração mostra a inquietação que suscita o crescimento da influência russa na Alemanha; e não demora muito para que o projeto NORD STREAM seja estruturalmente um plano moscovita e não europeu.

Os russos podem paralisar a distribuição de energia em vários países a partir da Polônia como desejar, e estarão em posição de vender o gás àquele que melhor oferta apresentar. Entretanto, a importância da Alemanha para a Rússia reside no fato de que ela constitui a plataforma a partir da qual ela vai poder desenvolver sua estratégia continental; GASPROM GERMANIA detém participações em 25 projetos cruzados na Grã-Bretanha, Itália, Turquia, Hungria e outros países. Isto nos leva a dizer que GASPROM – após certo tempo –está destinada a tornar-se uma das mais importantes empresas do mundo, senão a mais importante.


DESENHAR UM NOVO MAPA DA EUROPA

DEPOISDO MUNDO


Os dirigentes de GASPROM não somente desenvolveram seu projeto, mas também se estruturaram para se opor a NABUCCO. Assim, GASPROM detém 30% do projeto que deverá construir um segundo gasoduto para a Europa seguindo de perto o mesmo trajeto do projeto NABUCCO o que é, por intenção mesmo de seus participantes, um projeto “político” destinado a mostrar sua força freando, ou mesmo bloqueando, o projeto NABUCCO. Por outro lado Moscou se apressou em comprar o gás na Ásia Central e no mar Cáspio tendo como objetivo asfixiar e ridicularizar Washington política, econômica e estrategicamente, na mesma ação.

GASPROM explora as instalações de gás na Áustria, isto é no entorno estratégico da Alemanha e aluga também instalações na Grã-Bretanha e na França. Mesmo com todas essas instalações, são as importantes instalações de estocagem na Áustria que servirão para redesenhar a carta energética da Europa, pois serão elas que alimentarão a Eslovênia,Eslováquia, a Croácia, a Hungria, a Itália e a Alemanha. A essas instalações, se soma o centro de estocagem de Katrina, que GAZPROM construiu em cooperação com a Alemanha, a fim de poder exportar o gás para os grandes centros de consumo do Oeste da Europa.

GASPROM construiu uma instalação comum de estocagem com a Sérvia a fim de fornecer gás à Bósnia-Herzegovina e à própria Sérvia. Elaboraram estudos de viabilidade econômica, técnica, financeira e de tempos de construção, efetuados secretamente, sobre o modo de estocagem similar na República Tcheca, Romênia,Bélgica, Grã-Bretanha, Eslováquia, Turquia, Grécia e mesmo na França. GASPROM reforça assim a posição de Moscou como abastecedor de 41% do fornecimento do gás europeu. Isto significa uma mudança substancial nas relações entre o Oriente e o Ocidente a curto, médio e longo prazo. Isto anuncia igualmente um declínio da influencia dos Estados Unidos, por interposição de sistemas defensivos antimísseis, analisando o estabelecimento de uma nova organização internacional, na qual o gás será opilar principal. Em fim isto explica a intensificação do combate pelo gás da costa Leste do Mediterrâneo no Próximo Oriente.


NABUCCO E A TURQUIA EM DIFICULDADE


NABUCO deveria transportar gás numa distância de 3.900 quilômetros da Turquia para a Áustria e foi concebida para fornecer 31 bilhões de metros cúbicos de gás natural por ano, originados do Próximo Oriente e da bacia do mar Cáspio para os mercados europeus. A pressa da coalizão OTAN-ESTADOS UNIDOS-FRANÇA para colocar fim aos obstáculos que se antepunham aos interesses do gás no Próximo Oriente, em particular na Síria e no Líbano, reside no fato de que é necessário se assegurar de estabilidade e de um clima social favorável quando se trata de infra-estruturas e investimento no setor de gás. A resposta síria foi assinar um contrato para a transferência para seu território do gás iraniano, passando pelo Iraque. Assim é seguramente sobre o gás sírio e libanês que se focaliza a batalha que alimentará NABUCCO OU SOUTH STREAM?

OCONSÓRCIO NABUCCO está constituído por várias sociedades: a alemã (REW), a austríaca (OML), a turca (BOTAS), a búlgara (ENERGY COMPANY HOLDING) e a romena (TRANSGAZ). Há cinco anos os custos iniciais do projeto estavam estimados em 11,2 bilhões de dólares, mas eles poderão atingir 21,4 bilhões de dólares, de hoje a 2017. Isto levanta numerosas questões quanto a sua viabilidade econômica, sabendo-se que GAZPROM pôde concluir contratos com diferentes países que deveriam alimentar NABUCCO, o qual não poderá mais contar senão com os excedentes do Turcomenistão, sobretudo depois das tentativas fracassadas de domínio sobre o gás iraniano. Este é um dos segredos desconhecidos da batalha pelo Iran, que rompeu a linha vermelha em seu desafio ao USA e à Europa, escolhendo o Iraque e a Síria como trajetos do transporte de uma parte de seu gás.

Dessa forma a melhor esperança de NABUCCO se encontra no fornecimento do gás do Azerbaijão e na mina Shah Deniz, transformada quase na única fonte de abastecimento de um projeto que parece ter fracassado antes mesmo de começar. Isto é o que revela a aceleração das assinaturas de contratos passadas para Moscou pela recompra de fontes inicialmente destinadas a NABUCCO, de uma parte, e das dificuldades encontradas para impor modificações geopolíticas no Iran, na Síria e no Líbano, de outra parte. Tudo isso no momento em que a Turquia se apressa em reclamar sua parte no projeto NABUCCO, seja pela assinatura de um contrato com o Azerbaijão para a compra de 6 bilhões de metros cúbicos de gás em 2017, seja pela anexação da Síria e do Líbano, com a esperança de transformar-se num obstáculo ao transito do petróleo iraniano ou de receber uma parte da riqueza em gás sírio-libanesa. Aparentemente um lugar na nova ordem mundial, seja do gás ou de outra coisa, passa como restituição de um certo número de serviços, indo do apoio militar até ao acolhimento em seu território do dispositivo estratégico de blindagem antimíssil.

O que constitui, talvez, a principal ameaça para NABUCCO é a tentativa russa de fazê-lo fracassar, negociando contratos mais vantajosos que os seus em favor de GAZPROM para NORTH STREAM E SOUTH STREAM; o que invalidaria os esforços dos Estados Unidos e da Europa, diminuiria sua influência e transtornaria sua política energética no Iran e/ou no Mediterrâneo. Em outras palavras, GASPROM poderia tornar-se um dos investidores ou maiores exploradores das novas minas de gás na Síria ou no Líbano. Não por acaso que em 16 de agosto de 2011, o ministério sírio do petróleo anunciou a descoberta de um poço de gás em Qara, perto de Homs. Sua capacidade de produção seria de 400.000 metros cúbicos por dia (146 milhões de metros cúbicos por ano), sem mesmo falar do gás presente no Mediterrâneo.

Os projetos NORD STREAM E SOUTH STREAM têm pois reduzido a influencia política estadunidense, que parece daqui para a frente em atraso. Os sinais de hostilidade entre os estados da Europa central e a Rússia foram atenuados; mas a Polônia e os Estados Unidos não parecem dispostos a renunciar. Com efeito, no final de outubro de 2011, eles anunciaram a mudança de sua política energética logo após a descoberta de minas de carvão europeu que deveria diminuir a dependência frente à Rússia e o Próximo Oriente. Esse parece ser um objetivo ambicioso mas a longo prazo, em razão dos numerosos procedimentos necessários antes da comercialização; este carvão corresponde a rochas sedimentares encontradas a milhares de metros sob terra sendo necessárias técnicas de quebra hidráulica sob alta pressão para liberar o gás,sem contar com os riscos ambientais.



PARTICIPAÇÃO DA CHINA


A cooperação sino-russa no domínio energético é o motor da associação estratégica entre os dois gigantes.Trata-se, segundo os “experts”, da base da associação que foi a responsável pelo duplo veto reiterado em favor da Síria.

Essa cooperação não diz respeito somente ao abastecimento da China em condições preferenciais. A China é levada a se envolver diretamente na distribuição do gás via a aquisição de ativos e de instalações, em mais de um projeto de controle conjunto das redes de distribuição. Paralelamente Moscou formaliza sua flexibilidade no que se refere ao preço do gás, sob-reserva de estar autorizado a ter acesso ao mais lucrativo mercado interno chinês. Ficou acertado, em consequência, que os especialistas russos e chineses trabalharão em conjunto nos domínios seguintes: “A COORDENAÇÃO DAS ESTRATÉGIAS ENERGÉTICAS, A PREVISÃO E A PROSPECÇÃO, O DESENVOLVIMENTO DOS MERCADOS, A EFICÁCIA ENERGÉTICA E AS FONTES DE ENERGIA ALTERNATIVA”.

Outros interesses estratégicos comuns tais como os riscos que correm face ao projeto do “escudo antimíssil” dos Estados Unidos. Não somente Washington envolveu o Japão e a Coréia do Sul mas, no começo de setembro de 2011, a Índia foi convidada a fazer parte do grupo. Em consequência, as preocupações dos dois países se cruzam no momento em que Washington relança sua estratégia na Ásia central, isto é, sobre a Rota da Seda. Essa estratégia é a mesma que havia sido seguida por George Bush (projeto da Grande Ásia Central) procurando fazer recuar a influencia da Rússia e da China em colaboração com a Turquia, resolver a situação no Afeganistão até 2014 e impor a força militar da OTAN em toda região. O Uzbequistão já deixou claro que ela poderia acolher as forças da OTAN e Vladimir Putin estimou que o que poderia fazer fracassar a intrusão ocidental e impedir os USA de ficar atentos à Rússia seria a expansão do espaço Russo-Cazaquistão-Bielorussia em cooperaçãocom Pequim.

Essa percepção dos mecanismos da luta internacional atual permite ter uma ideia do processo de formação da nova ordem internacional, fundada sobre a luta pela supremacia militar e da qual o equilíbrio do sistema é a energia e em primeiro lugar o gás.


O GÁS DA SÍRIA


Quando Israel iniciou a extração de petróleo e de gás a partir de 2009, ficou claro que a bacia Mediterrânea tinha entrado no jogo e que, de acordo se a Síria fosse atacada, toda a região poderia beneficiar-se da paz, já que o século 21 será supostamente o da energia própria.

Segundo o Washington Institute for Near East Policy (WINEP, othink tank da AIPAC), a BACIA DO Mediterrâneo guarda as maiores reservas de gás e é na Síria que estariam as mais importantes reservas. Esse mesmo Instituto lançou a hipótese de que a batalha entre a Turquia e Chipre deverá se intensificar em função da incapacidade da Turquia assumir a perda do projeto NABUCCO (apesar do contrato assinado com Moscou em dezembro de 2011 para o transporte de uma parte do gás de SOUTHSTREAM via território turco).

A revelação do segredo do gás sírio faz com que se tome consciência da enormidade das perdas para quem participou dessa aposta. Quem controlar a Síria poderá controlar o Próximo Oriente. E a partir da Síria, porta da Ásia, ele será o portador da “chave da Casa Russa”, como afirmava a Tsarina Catarina II, assim como a da China, viaRota da Seda. Assim ele estará capacitado a dominar o mundo, porque o século 21 é o Século do Gás.

É por essa razão que os signatários do acordo de Damasco, permitindo que o gás iraniano passe pelo território do Iraque e chegue ao Mediterrâneo abrindo um novo espaço geopolítico e cortando a linha de acesso de NABUCCO, declarou: A SÍRIA É A CHAVE DA NOVA ERA.

IMAD FAWZI SHUEIBI

Tradução para o Réseau Voltaire– Mouna Alno-Nakha e Sega Ndoye.

Tradução para o português– Luiz Fernando Victor. Brasília, 23 de maio de 2012.


 


 
24/05/2012 - Quinta-feira

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