14/05/2012 - Segunda-feira
Recebidos por
William Stainton Moses
(A. Oxon)
Seção XI
(Nessa época, a influência que me envolvia dominava-me a ponto de excluir todas as outras comunicações. Em 24 de junho fiz em vão grande esforço de vontade para me comunicar com o Espírito que escrevia habitualmente; a influência era de caráter singularmente elevado. Eu fazia com pontualidade o meu trabalho cotidiano, mas todos os instantes em que podia dele distrair-me eram consagrados a refletir sobre ensinos tão novos para mim; à medida que eu pensava nesses ensinos, eles se me apresentavam à reflexão com uma força e beleza de coordenação quais antes me não haviam impressionado. Durante muito tempo tinha eu estudado a fundo as teologias, sem procurar descobrir erros nos diversos sistemas, antes confrontando-os que criticando. Achava-me agora em frente de novos esboços, que me pareciam tocar a raiz do que tinha sido até então artigo de fé. A 26 de junho, reportei-me às declarações de Imperator e dispus assim o caso:)
Pensei muito sobre o que me fizestes escrever e li algumas páginas a um amigo, cujo julgamento me inspira grande confiança. Surpreende-me que as doutrinas cristãs, consideradas até aqui como dogmas essenciais da fé, sejam negadas ao abrigo do símbolo da cruz. Não posso exprimir o meu embaraço com mais energia do que dizendo que, apesar da minha aprovação intelectual às vossas declarações, a fé no Cristianismo existente durante mais de 18 séculos não pode ser derribada levianamente pelos argumentos mais racionais que possam aparecer, quando não se apóiem sobre alguma autoridade reconhecida. Quereis dizer-me claramente que posição destinais a Jesus? Que prova podeis oferecer do direito que talvez vos tenha sido conferido de subverter ou de desenvolver a prédica do Cristo e de substituir por um novo Evangelho o antigo? Que evidência podeis dar-me de vossa própria identidade e da missão que proclamais? Homens sinceros e racionais têm necessidade de provas convincentes. A palavra, sem sanção, de um homem ou mesmo de um anjo, não logra fazer admitir a origem divina de um ensino que me parece subversivo. Se bem que a mudança seja muito gradual, parece-me existir uma diferença perceptível nas vossas comunicações, onde descubro divergências de ensinamentos entre alguns Espíritos que se têm comunicado por vosso intermediário; o laço tendente a unir um certo número de opiniões, com diversas origens, deve ser bem delicado.
Amigo, estamos muito satisfeitos por ter chegado a estimular o vosso espírito e por haver tirado dele uma série de perguntas racionais. Nenhuma disposição de espírito – crede-nos ao menos nisso – é mais agradável ao Supremo do que quando se procura a verdade, com zelo e inteligência. Longe de combater-vos o desejo de verificar as idéias novas, sem pensamento preconcebido – aprovamo-lo.
É isso o indício de um espírito livre e leal que não quer renunciar às suas primeiras crenças sem razões substanciais e que, entretanto, está pronto a reconhecer a verdade, se puder obter certezas interiores e exteriores.
Essas dúvidas e inquietações têm muito mais valor do que a crédula disposição daquele que aceita tudo quanto lhe é apresentado, sob uma cor capciosa; preferimo-la sobretudo à indiferença dessas naturezas estacionárias a quem nenhuma tormenta demove, a cuja vítrea superfície nenhuma brisa agita e cuja plácida inércia é refratária a qualquer conselho espiritual.
Louvando as vossas dúvidas, a elas responderemos nos limites do nosso poder. Há um ponto além do qual nos é impossível fornecer provas; deveis sabê-lo, comparando-nos às testemunhas chamadas aos vossos tribunais de justiça; estamos em uma situação desvantajosa por não poder produzir o gênero de evidência que prevalece entre vós. Como não somos da Terra, as nossas afirmativas, mesmo em vasta proporção, só podem ser corroboradas pelo testemunho dos nossos irmãos espirituais. Vários deles vos falaram da nossa identidade terrestre e vos deram a prova, que deveria ser concludente, de que conhecemos intimamente, nas menores particularidades, a vida terrestre daqueles cujos nomes tomamos. Se isso não basta para vos convencer e se pensais que essas informações foram obtidas por Espíritos enganadores, sempre prontos a mistificar, lembrar-vos-emos as palavras de Jesus: “Conhecereis a árvore pelos seus frutos.” “Os homens não colhem uvas dos espinheiros, nem figos dos abrolhos.” Referimo-nos sem temer ao conteúdo do nosso ensinamento, cuja divindade se prova.
Não temos que insistir por mais tempo sobre esse ponto; as vossas inquietações não nos surpreendem, mas desde que a nossa resposta não pode convencer-vos, nada mais temos a acrescentar, cumprindo-nos aguardar com paciência o momento em que vereis a luz.
Com vagar falaremos, em outras circunstâncias, dos Espíritos que, tendo vivido em diferentes épocas da história desse mundo, sob climas diversos, têm idéias divergentes sobre Deus e a vida futura.
Presentemente vos indicamos uma falsa concepção, que é inseparável do estado em que viveis. Não podeis ver, como nós, a quase nulidade do que chamais opinião; não podeis saber, devido à cegueira dos vossos olhos, como se rompe o véu depois de a alma separar-se do corpo carnal; de que modo as especulações a que se liga tanta importância são consideradas interpretações vagas enquanto se percebe o gérmen de verdade oculto sob as doutrinas teológicas, gérmen muito semelhante em essência, não obstante os seus diferentes graus de desenvolvimento.
Ah! amigo, a religião não é um problema tão abstrato como o homem o considera; porquanto a verdade não é o patrimônio exclusivo de nenhum homem nem de seita alguma. Pode estar ou está na filosofia de Atenodoro, quando, na antiga Roma, ele aspirava pela depuração do espírito e sujeição da carne; e pode estar na procura da união com o seu Mestre, que dava a Hipólito a força de perder a existência mortal, por sua confiança em uma vida real, entrevista confusamente. A mesma pesquisa de verdade enobreceu Plotino e o arrebatou mesmo, durante a sua passagem pela Terra, bem além da esfera terrestre. A mesma semente residia no seio de Algazzuli, apesar dos seus erros; sustentou as especulações de Alessandro Archillini e deu força e realidade às palavras calorosas que caíram de seus lábios. A mesma jóia pura reverbera agora entre as criaturas de boa-vontade; é o patrimônio comum que lhes permite reunirem-se a fim de trabalhar em comum para um mesmo fim, que é a apuração desse depósito de verdade, que o homem recebeu de seu Deus, e o enobrecimento do destino humano pela expansão de idéias mais exatas e mais espirituais sobre Deus e o futuro da alma. As suas antigas opiniões estão muito desvanecidas e não deixaram atrás nenhum traço dos prejuízos materiais que envolviam a alma e lhe detinham o progresso, mas do diamante por elas ocultado refletem-se cintilações sempre crescentes e imperecíveis. O amor da verdade é o laço misterioso de simpatia, que tem a força de unir, para uma obra comum, Espíritos que, na Terra, professavam aparentemente convicções opostas. Isso pode fazer-vos compreender por que trabalhamos com instrumentos diferentes, escolhendo-os segundo a sua especialidade e faculdade de adaptação, da qual somos os melhores juízes.
Esperamos que depois da reflexão reconheçais o bom senso do que vos dizemos. Quanto às provas irrecusáveis, é preciso contentar-vos com a esperança, até que, rompido o véu, possais por vossa vez e conosco perceber o que é invisível aos vossos olhares ainda limitadíssimos. A nossa grande esperança é que chegareis gradualmente a ser convencido. Aplicai-nos a divina lei do Mestre, de julgar os outros como a vós mesmos.
Errais supondo que os nossos ensinos oferecem contradições. Inteligências de ordens diversas têm comunicado convosco, expondo argumentos e pontos de vista variados. Não negamos que de preferência temos procurado desenvolver em vós os germens da verdade que descobrimos, em vez de entrar em luta com as vossas opiniões errôneas; havemos evitado as discussões inúteis e procurado os pontos de contato. Voltaremos mais tarde sobre certas matérias, que de propósito deixamos de lado. Quando pedistes informações, indicando que não estáveis obstinado em conservar tais ou tais idéias, esclarecemos-vos sem escrúpulo. Podemos ver quando a corrente do pensamento vos arrasta para longe de antigos portos onde não vos sentis mais em segurança, e então vos guiamos para não cairdes na torrente, arriscando-vos ao naufrágio. Desatamos delicadamente os laços para desprender o vosso espírito do passado morto, e estamos encarregados de o conduzir a um ancoradouro mais seguro. Queremos, se nisso cooperardes, torná-lo capaz de se elevar acima das tempestades e de estar pronto, com uma fé nova e vivaz, a atravessar as vagas encapeladas que o separam do porto da paz.
Nesse tentame, não vos temos em nada desviado ou iludido, pois tudo quanto temos afirmado é de escrupulosa exatidão.
Não há verdadeiramente divergência nos ensinos de outros que falaram; as contradições aparentes são devidas à dificuldade de comunicação, à influência variável da vossa própria mentalidade, do vosso estado físico, à novidade do trabalho para alguns e sobretudo às vossas idéias acanhadas. Só vagamente podemos simbolizar verdades que os vossos olhos espiritualizados contemplarão um dia em seu vasto esplendor; não podemos falar com clareza quando o espírito do vosso médium está perturbado ou o seu corpo e o seu estado mental agitados pela moléstia. Uma atmosfera tempestuosa, uma perturbação elétrica, a proximidade de seres humanos antipáticos ou hostis, impressionam a comunicação e podem alterá-la um pouco. Daí, as variantes que haveis descoberto, aliás raras, mas que bem pouca coisa são, e que tendem a desaparecer quando os obstáculos forem afastados. Então reconhecereis o discernimento superior que vos guiou em uma fase difícil e perigosa.
Muito vos lastimais da pouca probabilidade em ser aceita a nossa doutrina, entretanto não sabeis quase nada a esse respeito. Está muito mais próximo do que pensais o tempo em que a antiga fé, que durou tanto e que o homem remendou tão grosseiramente, cederá lugar a uma fé mais nobre, mais elevada, não antagônica, porém suplementar, e o puro Evangelho que Jesus pregou achar-se-á em nível de conhecimento mais adiantado. Pois sabei, bom amigo, que nenhum esforço é tentado sem que tenha sido considerada a correlação entre o Evangelho de Deus e as necessidades do homem. O que vos trazemos aplica-se também a outros e se espalhará sem interrupção, por processos bem graduados, entre as criaturas aptas a compreender a fé.
O Mestre assim o quis. Essa hora não soou para vós e a nossa vidência é menos circunscrita que a vossa. Em tempo oportuno os princípios que acabamos de propagar serão conhecidos dos homens. Até então as almas progressistas serão instruídas, e uma semente preciosa está sendo semeada: a colheita e a conservação serão quando for preciso. Deveis esperar como nós.
Repetimos que Deus não impõe suas bênçãos a ninguém: oferece-as. A responsabilidade da recusa ou do aceite pertence-vos. Se refletirdes sobre o nosso entretenimento, reconhecereis que a natureza do caso contém mais que uma prova presuntiva da validez das nossas pretensões. A evidência completa será admitida por vós e por aqueles a quem ansiamos em revelar os nossos pensamentos. Ninguém pode a isso recusar-se, a não ser os que estão mergulhados sem esperança de libertação, nas névoas da mais profunda superstição, ou aferrados a um dogmatismo intransigente. Nada temos, aliás, de comum com eles. Não falamos mesmo às almas que têm achado na sua fé o apoio suficiente; deixai-as vinculadas a ela; o momento de progredir ainda lhes não soou e só o tempo o fará.
A nossa revelação em nada difere da que a precedeu, antes marca um passo para diante, como cada desenvolvimento da ciência humana o faz. Os nossos conhecimentos provêm da mesma fonte e correm pelos mesmos canais, que são hoje, como então, terrestres e por conseguinte falíveis. Assim sucederá enquanto Deus se revelar por agentes humanos. Lembrai-vos do ponto de partida das nossas instruções, para o qual invocamos com insistência o vosso raciocínio; não vos solicitamos essa fé cega que não quer separar-se dos velhos ensinos, unicamente porque são velhos, assim como a aceitação do novo, por ser ele novo. Pedimos que penseis calmamente sobre o que tendes aprendido e, depois que fizerdes uma inteligente investigação, rejeitai ou aceitai, quando a vossa convicção estiver bem escudada.
Deus proíbe que incitemos, mesmo em aparência, qualquer homem a tornar-se antagonista real ou imaginário de uma crença que, durante mais de mil e oitocentos anos, foi honrada por miríades de almas zelosas e progressistas, tanto quanto por almas transviadas, mas sinceras e ardentes. A sua longa duração lhe dá direito à veneração, mas com a nossa ampla vista descobrimos a necessidade de modificar uma doutrina que, apropriada às gerações menos adiantadas, se tornou insuficiente. Em todo o caso, não queremos provocar revoluções violentas. Apuramos e infundimos uma vida nova. O Salvador lançou os alicerces de uma fé mais nobre do que a revelada sobre o Sinai ao ribombar do trovão; recomeçamos o divino edifício e oferecemos ao mundo uma crença mais adaptável às suas capacidades atuais, mais apropriada às suas recentes necessidades.
“O mundo a rejeitará!” Bem, mas ao menos tê-la-emos apresentado, e aqueles que a tiverem acolhido sentirão a sua benéfica influência. Há quase sempre um longo intervalo entre o primeiro movimento de divulgação de uma verdade e a sua aceitação final; a semente parece perdida. O dia de preparação pode ser longo, a noite durante a qual o semeador espera pode ser acabrunhadora, mas a colheita é certa, e como não vos seria permitido retardá-la, podeis ajudar a arrecadação. Mas quer o homem ajude ou não, a obra de Deus se fará. É só ao indivíduo que a aceitação ou a renúncia da comunicação divina importa substancialmente. Quando uma alma se adianta ou se atrasa, os anjos regozijam ou afligem-se; eis tudo.
Perguntais que posição assinalamos a Jesus, o Cristo. Ainda não é chegado o momento de entrar em especiosas comparações entre os educadores, que em épocas diferentes foram enviados por Deus; mas sabemos que nenhum Espírito mais puro, mais divino, mais nobre, mais bendito e mais abençoado desceu à Terra. Nenhum mais dignamente conquistou, por sua vida de amor e sacrifício voluntários, a veneração e o devotamento da Humanidade, nenhum espalhou sobre ela mais bênçãos nem realizou maior obra para o serviço de Deus. Damos a todos os grandes mestres os louvores que lhes são devidos e citamos como exemplo a sua abnegação, o seu amor até ao sacrifício, por uma geração tristemente inapta a seguir tais modelos.
Se os homens tivessem empregado a sua energia para imitar o sublime devotamento, a firmeza, a pureza de pensamento e de vida que animaram o Cristo, teriam disputado menos sobre a sua natureza, e teriam sido menos pródigos de inúteis sofismas metafísicos. Os teólogos das idades obscuras não vos teriam legado a maldita herança das suas insensatas especulações. Os homens teriam seguido o simples Evangelho anunciado pelo Cristo, em vez de serem pervertidos por uma teologia antropomórfica que fez derramar lágrimas e sangue, e ultrajar o puro Espírito.
Amigo, deveis discernir entre a verdade de Deus e as glosas do homem. Atribuir a um homem as honras divinas, em detrimento da própria homenagem e do próprio amor que a Deus pertencem exclusivamente, é um erro prejudicial que afasta o homem dos seus deveres para com o Eterno. “A letra mata – diz a vossa Escritura –, a letra mata, mas o espírito vivifica.” Assim, rejeitamos a fábula de um inferno material e proclamamos idéias mais puras e mais racionais; repudiamos essa noção ortodoxa da expiação e do sacrifício por delegação e proclamamos uma religião espiritualizada. Arrancamos-vos ao formalismo, à inerte concepção literal do passado, para vos reconduzir a uma religião de verdade espiritualizada, ao amorável simbolismo da instrução angélica, que vos conduzirá no futuro para as alturas onde o Espírito está livre dos vínculos materiais. Falamos-vos com cuidado, compenetrados da importância das nossas palavras, que deveis examinar com o único desejo de achar a verdade, implorando o auxílio divino, sempre concedido àqueles que o suplicam.
† Imperator
Leia na próxima Edição: (amanhã, terça-feira, 15
Seção XII
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