COLUNA DO PAULO TIMM - Diretamente de Lisboa, Portugal
A ESQUERDA E OS DIREITOS HUMANOS
Diante do exposto ficam evidentes os confrontos da esquerda tradicional com os Direitos Humanos, só levantados como bandeira própria ,quando, em situações críticas de ditadura ou de criminalização dos movimentos sociais, seus líderes são apresentados como vítimas. Para os conservadores, há também um confronto, pois jamais podem aceitar uma doutrina que supõe a transparência do espaço público simultânea à a efetiva autonomia dos sujeitos que a ela concorrem em busca de uma razão consensual na confecção de um destino coletivo.
Construída sobre os fundamentos do respeito ao indivíduo, a doutrina dos Direitos Humanos desagrada aos Governos de esquerda que privilegiam as garantias sociais e a equidade, mesmo com o sacrifício das liberdades civis e políticas. Na prática, estes governos rechaçam a consolidação da doutrina com a extensão, indivisibilidade e universalidade de seus componentes. Definitivamente, rejeitam a proposta de que socialismo e liberdade são siameses e que a construção de uma cidadania coletiva só é possível através do respeito sagrado à individualidade, no que ela tem de específico, inclusive, em sua subjetividade. Isto é particularmente visível na esquerda brasileira, ainda ancorada em substratos dogmáticos do passado stalinista de grande parte de seus quadros e leituras ortodoxas dos textos clássicos. De resto, parece incrível que ainda haja preconceitos com a mera expressão “social-democracia” e que toda uma cultura de esquerda européia do pós-guerra, na qual despontam nomes de grande envergadura intelectual e credibilidade política, como Isaac Deutscher, Eric Hobsbawn, Cornelius Castoriadis, Norberto Bobbio, além de inúmeras revistas como “New Left Review” e outras, sejam simplesmente ignoradas. Para não falar do verdadeiro horror que a mera menção ao “liberalismo” ainda lhes provoca. Como lembrou recentemente o Ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, em entrevista amplamente divulgada, nos Estados Unidos ser “liberal”, é ser “de esquerda”, não , por certo, uma esquerda como nós entendemos, mas, sem dúvida, uma força interna àquele país que contribui decisivamente para estancar o fluxo da barbárie conservadora.
O Governo, do Lula, que se proclama de esquerda e que reúne forças de apoio eleitoral nas áreas populares, aliando-se no plano internacional com forças igualmente tidas como de esquerda, fica à mercê, pela influência de seus principais colaboradores, destas “sinistras” influências. E a questão dos Direitos Humanos , no seu discurso, ficou fragmentada, dependendo da ocasião e do segmento de Estado a que se referia. Calou-se, de um lado, diante dos presos políticos em Cuba e da discriminação às mulheres e homossexuais no Irã. E assina, por outro, sustentou, ainda que com ressalvas o Decreto que institui o III Plano Nacional dos Direitos Humanos, tendo ainda dado passos significativas na execução da Lei da Anistia. Com tudo isto apropriou-se da amplitude do conceito de Direitos Humanos para mover ações que contribuíram para o aprofundamento da justiça social no processo de desenvolvimento e que encaminham uma maior discussão interna sobre a imperativa abertura do sistema de comunicação social e mídia, de forma a abrir o espaço público a uma atuação mais efetiva de novos e emergentes agentes de ação política.
Como já registrei outrora: Como um cidadão dividido entre dois mundos, o da moral e o da práxis, Lula navega com mais precisão do que caminha, orientando-se, sempre, mais pela intuição do que pela razão ou seus argumentos. Pois, mais do que ninguém, como bom timoneiro, sabe que navegar é preciso, mas viver não é preciso, além de que é bem mais seguro...Pois “viver é muito perigoso”. Sua sucessora, Dilma Roussef não tem,
certamente, nem o carisma nem a intuição de Lula. Tendo já escolhido a Deputada Maria do Rosário, do PT/RS, para a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, um temperamento difícil, ideologicamente franco, dá um passo em falso na controvertida matéria. Melhor fora um nome de fora da militância de esquerda, capaz de compor as demandas radicais de movimentos sociais envolvidas nos Encontros Nacionais de Direitos Humanos com demandas específicas, daí inexplicavelmente excluídas, tais como as vítimas de violências em geral e as próprias forças da ordem. Um projeto elaborado por oficiais superiores da Polícia Militar, alunos do equivalente ao Curso de Estado Maior das Forças Armadas - por mim orientado-, no início da década, regulamentando estes Encontros Nacionais, foi entregue ao então deputado Agnelo Queiroz, da Comissão de Direitos Humanos. Ele vegeta, como outros tantos, sem resposta, nos escaninhos da Câmara dos Deputados. Mas seria um marco regulatório da matéria que poderia evitar, no futuro, novas assacadas da “boa sociedade” contra os Direitos Humanos. Duvido que Maria do Rosário o desengavete...
F I M
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