Compilação:
Enviado por Leonardo Boff -
13.2.2012
| 13h01m
Para onde irão os indignados e os
'occupiers'?
Uma
das mesas de debates importante no Forum Social Temático em Porto Alegre, da
qual me coube participar, foi escutar os testemunhos vivos dos Indignados da
Espanha, de Londres, do Egito e dos USA.
O que
me deixou muito impressionado foi a seriedade dos discursos, longe do viés
anárquico dos anos 60 do século passado com suas muitas “parolle”. O tema
central era “democracia já”. Reinvindicava-se uma outra democracia, bem
diferente desta a que estamos acostumados, que é mais farsa do que realidade.
Querem
uma democracia que se constrói a partir da rua e das praças, o lugar do poder
originário. Uma democracia que vem de baixo, articulada organicamente com o
povo, transparente em seus procedimentos e não mais corroída pela corrupção.
Esta democracia, de saída, se caracteriza por vincular justiça social com
justiça ecológica.
Curiosamente,
os indignados, os “occupiers” e os da Primavera Árabe não se remeteram ao
clássico discurso das esquerdas, nem sequer aos sonhos das várias edições do
Forum Social Mundial.
Encontramo-nos
num outro tempo e surgiu uma nova sensibilidade. Postula-se outro modo de ser
cidadão, incluindo poderosamente as mulheres antes feitas invisíveis, cidadãos
com direitos, com participação, com relações horizontais e transversais
facilitadas pelas redes sociais, pelo celular, pelo twitter e pelos facebooks.
Temos
a ver com uma verdadeira revolução. Antes as relações se organizavam de forma
vertical, de cima para baixo. Agora é de forma horizontal, para os lados, na
imediatez da comunicação à velocidade da luz.
Este
modo representa o tempo novo que estamos vivendo, da informação, da descoberta
do valor da subjetividade, não aquela da modernidade, encapsulada em si mesma,
mas da subjetividade relacional, da emergência de uma consciência de espécie
que se descobre dentro da mesma e única Casa Comum, Casa, em chamas ou ruindo
pela excessiva pilhagem praticada pelo nosso sistema de produção e consumo.
Essa
sensibilidade não tolera mais os métodos do sistema de superar a crise
econômica e derivadas, sanando os bancos com o dinheiro dos cidadãos, impondo
severa austeridade fiscal, a desmontagem da seguridade social, o achatamento
dos salários, o corte dos investimentos no pressuposto ilusório de que desta
forma se reconquista a confiança dos mercados e se reanima a economia.
Tal
concepção é feita dogma e ai se ouve o estúpido bordão: “TINA: there is no
alternative”, não há alternativa. Os sacrílegos sumos sacerdotes da trindade
nada santa do FMI, da União Européia e do Banco Central Europeu deram um golpe
financeiro na Grécia e na Itália e puseram lá seus acólitos como gestores da
crise, sem passar pelo rito democrático.
Tudo é
visto e decidido pela ótica exclusiva do econômico, rebaixando o social e o
sofrimento coletivo desnecessário, o desespero das famílias e a indignação dos
jovens por não conseguirem trabalho. Tudo pode desembocar numa crise com
consequências dramáticas.
Paul
Krugmann, prêmio Nobel de economia, passou uns dias na Islândia para estudar a
forma como esse pequeno país ártico saiu de sua crise avassaladora. Seguiram o
caminho correto que outros deveriam também ter seguido: deixaram os bancos
quebrar, puseram na cadeia os banqueiros e especuladores que praticaram
falcatruas, reescreveram a constituição, garantiram a seguridade social para
evitar uma derrocada generalizada e conseguiram criar empregos.
Consequência:
o pais saiu do atoleiro e é um dos que mais cresce nos países nórdicos. O
caminho islandês foi silenciado pela mídia mundial de temor de que servisse de
exemplo para os demais países. E a assim a carruagem, com medidas equivocadas,
mas coerentes com o sistema, corre célere rumo a um precipício.
Contra
esse curso previsível se opõem os indignados. Querem um outro mundo mais amigo
da vida e respeitoso da natureza. Talvez a Islândia servirá de inspiração. Para
onde irão? Quem sabe? Seguramente não na direção dos modelos do passado, já
exauridos.
Irão
na direção daquilo que falava Paulo Freire “do inédito viável” que nascerá
desse novo imaginário. Ele se expressa, sem violência, dentro de um espírito
democrático-participativo, com muito diálogo e trocas enriquecedoras. De todas
as formas o mundo nunca será como antes, muito menos como os capitalistas
gostariam que ficasse.
Leonardo
Boff é teólogo e filósofo
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